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Lula opta por discurso moderado sobre a guerra em Gaza na cúpula da União Africana

Convidado para participar da 37ª Cúpula da União Africana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva adotou um tom moderado neste sábado (17) ao comentar a guerra entre Israel e o grupo Hamas na Faixa de Gaza. A fala de Lula ocorreu em meio a discursos inflamados das lideranças africanas contra Tel Aviv e a favor dos palestinos, na plenária da reunião em Adis Abeba, na Etiópia.


Lula se prepara para discursar na cúpula da União Africana em Adis Abeba, onde o tema da guerra em Gaza era um dos destaques. (17/02/2024)
 © Ricardo Stuckert/ divulgação

Ao abordar o tema, o presidente evocou “o humanismo dos grandes líderes da descolonização africana”.

“Ser humanista hoje implica condenar os ataques perpetrados pelo Hamas contra civis israelenses e demandar a libertação imediata de todos os reféns. Ser humanista impõe igualmente o rechaço à resposta desproporcional de Israel, que vitimou quase 30 mil palestinos em Gaza, em sua ampla maioria mulheres e crianças, e provocou o deslocamento forçado de mais de 80% da população”, defendeu Lula. “A solução para essa crise só será duradoura se avançarmos rapidamente na criação de um estado palestino livre e soberano. Um estado palestino reconhecido como membro pleno das Nações Unidas”, salientou.

Ele aproveitou para pedir uma reforma no Conselho de Segurança da ONU, defendida há anos pela diplomacia brasileira, indicando que “há dois anos a guerra da Ucrânia escancara a paralisia do Conselho” e a sua ineficiência para resolver conflitos. Também voltou a tocar na tecla da reforma das instituições multilaterais que “não ajudam mais – pelo contrário, sufocam os países”.

Palanque contra Israel

O presidente brasileiro foi um dos primeiros a subir ao palanque, na abertura da cúpula anual da organização africana. Antes dele, lideranças como o presidente da Comissão Africana, Moussa Faki Mahamat, ressaltaram “o apoio indefectível” dos africanos à causa palestina e saudaram as investigações realizadas pela Corte Internacional de Justiça sobre a denúncia de genocídio apresentada pela África do Sul ao tribunal, contra Israel.

O primeiro-ministro da Autoridade Palestina, Mohammad Shtayyeh, também era convidado e, logo antes da fala de Lula, pediu apoio pelo fim da colonização do território palestino, boicote a Israel e a saída do premiê israelense Benjamin Netanhyahu, sob aplausos da plateia.

Lula e Shtayyeh tiveram uma reunião bilateral nesta manhã para abordar o conflito que já deixou quase 30 mil mortes no enclave palestino. Segundo fontes do governo brasileiro, o primeiro-ministro palestino fez questão de se dissociar do grupo Hamas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumprimenta o primeiro-ministro palestino, Mohammad Shtayyeh, à margem da cúpula da União Africana, em que participa como convidado, em Adis Abeba, na Etiópia. (17/02/2024)
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumprimenta o primeiro-ministro palestino, Mohammad Shtayyeh, à margem da cúpula da União Africana, em que participa como convidado, em Adis Abeba, na Etiópia. (17/02/2024) © Ricardo Stuckert

A guerra em Gaza também seria evocada em uma reunião entre Lula e o secretário-geral da ONU, António Guterres – mas o chefe das Nações Unidas cancelou a vinda à Etiópia e a conversa não aconteceu.

Lula quer ‘compartilhar tudo com o continente africano’

Em seu discurso aos líderes africanos, o brasileiro também defendeu o reforço do chamado Sul global para uma construção de “uma ordem mundial mais justa”. Ele alegou que, “sem os países em desenvolvimento, não será possível um novo ciclo de expansão mundial”.

“O Sul global está se constituindo em parte incontornável da solução para as principais crises que afligem o planeta. Crises que decorrem de um modelo concentrador de riquezas que atinge sobretudo os mais pobres e, entre eles, os imigrantes”, afirmou. “A alternativa às mazelas da globalização neoliberal não virá da extrema direita racista e xenófoba. (…) Não haverá estabilidade nem democracia com fome e desemprego.”

Lula frisou a disposição do Brasil de retomar e ampliar a parceria com o continente africano, em áreas como agricultura, energias renováveis, saúde, ciência e tecnologia. Também propôs cooperação para a recuperação de áreas degradadas no Brasil e no continente, com vistas a “construir um cinturão verde no Sul global”.

“O Brasil, durante muitos séculos, foi governado olhando para os Estados Unidos, a América do Norte, e olhando para a Europa. O Brasil não via nem a América do Sul, que estava nas costas do Brasil, e muito menos via o continente africano”, comentou o presidente.

“Um oceano não é um obstáculo para a nossa aproximação, ele é uma dádiva de Deus para a nossa aproximação. (…) O Brasil não tem no mundo a força que eu gostaria que tivesse, mas tudo, muito ou pouco, que o Brasil tem eu quero compartilhar com o continente africano, porque nós temos uma dívida histórica de 300 anos de escravidão e a única forma de pagar é com solidariedade e com muito amor”, finalizou Lula.

Depois do almoço oferecido aos chefes de Estado, o brasileiro deve se reunir com o presidente de Moçambique e pode se encontrar com os presidentes do Quênia e da Comissão Africana. A viagem se encerra neste domingo, quando Lula retorna a Brasília.

Lúcia Müzell, enviada especial da RFI Brasil a Adis Abeba

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